IDOSOS

Lei institui programa de reinserção de idosos no mercado de trabalho

Censo demográfico realizado pelo IBGE de 2010 mostra que aproximadamente 10% da população campo-grandense é composta por pessoas com idade igual ou superior a 60 anos

Adrian Albuquerque, Gabriela Coniutti e Lucas Castro28/05/2018 - 16h32
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A Câmara Municipal de Campo Grande aprovou Lei que institui o "Programa Ativa Idade, que estabelece políticas públicas para a reinserção de idosos no mercado profissional, para exercerem atividades remuneradas ou não remuneradas. A Lei normatiza a criação de um banco de vagas de emprego e a Prefeitura Municipal de Campo Grande (PMCG) fará a intermediação entre idosos cadastrados, órgãos públicos e empresas privadas interessadas na contratação de pessoas acima dos 60 anos de idade. A Lei Nº 5997 foi sancionada pelo prefeito municipal de Campo Grande, Marcos Marcello Trad (PSD) e publicada no Diário Oficial de Campo Grande (DIOGRANDE) no dia 7 de maio. 

Segundo o censo demográfico do Brasil de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 10% da população campo-grandense é composta por pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, o que representa cerca de 78,3 mil idosos.

De acordo com o estudo "Envelhecimento populacional: uma realidade brasileira" (1987), de Luiz Roberto Ramos, Renato Veras e Alexandre Kalache, publicado na Revista de Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), o Brasil enfrenta as implicações sociais e de saúde resultado de um processo de envelhecimento semelhante ao dos países desenvolvidos.

A pesquisa aponta que, com o declínio das taxas de fecundidade e mortalidade, o país terá sexta população mais idosa do planeta no ano 2025, com 34 milhões de pessoas acima de 60 anos, o que representará, aproximadamente, 14% da população brasileira. Esse índice foi confirmado pelo Relatório Mundial de Saúde e Envelhecimento, publicado em 2015 pela Organização Mundial da Saúde (OMS). 

   Rocha é o autor do "Programa Ativa Idade"
   (Foto: Arquivo/CMCG)  

Segundo o autor do projeto de lei, vereador João Rocha o programa tem como objetivo diminuir a desvalorização social decorrente do processo de envelhecimento populacional em Campo Grande. “Embora, no aspecto econômico, as pessoas idosas possam a ser vistas como improdutivas, a realidade mostra que este grupo pode permanecer ativo profissionalmente. Percebo uma presença crescente dos idosos nos postos de trabalho, e que estes podem contribuir definitivamente para o mercado de trabalho, por meio dos conhecimentos adquiridos".

O autor do projeto de lei afirma que, com o crescente envelhecimento populacional em Campo Grande, as empresas precisam se preparar para esse cenário. "Cabe às empresas se prepararem para essa nova realidade, promoverem um ambiente organizacional que estimule a produtividade e o aproveitamento desse capital intelectual das pessoas idosas. Os idosos economicamente ativos terão a experiência como grande aliada em uma sociedade baseada na educação e que tem a informação como matéria-prima, pois a partir da capacidade de transformar dados em informação é que se pode gerar produtividade”.

Rocha afirma que banco de vagas de emprego para idosos deverá funcionar de forma integrada com o Sistema Nacional de Emprego (SINE) e demais órgãos da administração pública municipal e estadual. “Precisamos incentivar cada vez mais essa ligação entre os idosos e as vagas de emprego, e nada melhor do que usar todo o conhecimento especializado das agências de emprego para que possamos garantir e estimular a reinserção do idoso no mercado de trabalho".

O vereador ressalta que a Lei prevê a disponibilização de vagas remuneradas e não remuneradas. "As oportunidades de trabalhos voluntários deverão ser preenchidas por pessoas idosas que recebem mensalmente uma remuneração e que busquem apenas participarem de forma ativa do mercado de trabalho e evita, desta forma, o isolamento social a que todos estão fadados. Em hipótese alguma o idoso que não possuir renda poderá ser utilizado no mercado de trabalho sem remuneração, pois, além do objetivo do convívio social, esta remuneração servirá para seu sustento e melhoria na qualidade de vida”.

   Juliane Penteado é especialista em Direito Previdenciário
   (Foto: Lucas Castro)

Para a advogada e coordenadora do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) em Mato Grosso do Sul e na região Centro-Oeste, Juliane Penteado os primeiros anos de aposentadoria são os mais difíceis devido ao intenso envolvimento com a relação de trabalho. “Para aquele que está em atividade desde muito cedo é complicado parar de trabalhar, de não ter mais o compromisso do horário, a responsabilidade de antes. Até mesmo casos de constatação de alguma doença, de incapacidade, a maioria não quer aposentar. Se ele está incapacitado é porque aguentou até o último momento e, a partir daí, teve que se aposentar".

A advogada ressalta, também, que muitos contribuintes que se aposentam antes do limite de idade ou tempo de serviço preferem continuar no mercado profissional. “Na maioria das vezes, os que se aposentam cedo por tempo de contribuição no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ainda continuam no mercado de trabalho, porque ele tem uma dificuldade de parar, sentem que ainda são muito úteis. A palavra 'aposentado' pode soar como alguém que está inutilizado, inativo. Então, psicologicamente não tem uma boa repercussão para aquele indivíduo”.

De acordo com a Lei, as empresas que aderirem ao “Programa Ativa Idade” e possuírem pelo menos 25% de seus empregados com idade igual ou superior a 60 anos receberão incentivos fiscais ou outra forma de compensação indicada pelo Poder Público Municipal, sem prejudicar a arrecadação e a aplicação das receitas do município.

Juliane Penteado acredita que as empresas privadas precisam mudar o critério de avaliação do trabalho realizado por uma pessoa idosa. “Nós vivemos numa geração do ‘estalo’, tudo é para ontem, tudo tem que ser rápido e, a depender do tipo de atividade exercida, pode ser que um idoso não seja interessante para essa empresa. Acho que o empresariado precisa avaliar a questão da qualidade para o tipo de trabalho desenvolvido. Claro que o idoso não vai ter a mesma habilidade para ser um office-boy na rua e fazer mil coisas ao mesmo tempo, mas ele terá uma condição de otimizar o tempo".

A advogada também afirma que grande parte das empresas no Brasil apenas contratam para o preenchimento de cotas. "As empresas não contratavam antes da existência de determinadas leis. É o que também vai acontecer com o idoso, assim como a pessoa com deficiência. É preciso que haja uma outra lei que regulamente quais serão os incentivos para essas empresas que contratarem idosos. Caso não exista essa definição, talvez os empresários não fiquem tão estimulados a contratarem simplesmente para atender uma demanda social, porque eles visam o lucro”.
 
Segundo o professor e pesquisador em Ciências Sociais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Guilherme Passamani de um modo geral, a sociedade brasileira está despreparada para o envelhecimento da população, principalmente no que se refere ao desrespeito às pessoas idosas. “Em algumas culturas, o envelhecimento é sinônimo de sabedoria e as pessoas se valem sempre das opiniões dos mais velhos, que seriam uma espécie de guardiões da sabedoria. Em nossa sociedade, isso pouco existe, os velhos são entendidos como pesos, fardos que as famílias precisam carregar".

O pesquisador ressalva que o envelhecimento, efetivamente, é tratado como um fim da vida. "É como um momento de desvalorização dos sujeitos, principalmente em nossa sociedade. É evidente, do ponto de vista biológico, que quanto mais idade nós temos, talvez mais perto da morte nós estejamos, mas nós não somos só um corpo biológico, nós somos sujeitos culturais, seres sociais”.

Passamani ressalta que, com o aumento da longevidade, é necessária uma transformação na forma de gestão da sociedade. “O impacto do envelhecimento deve ser ressignificado. As pessoas sempre entenderam os idosos são descartáveis, que podem ficar restritos ao mundo da casa, ser mandados para asilos e, posteriormente, para os cemitérios. Hoje, esse momento é muito depois, prolongou-se o curso da vida e as pessoas ainda não entenderam como inserir todos esses sujeitos de forma digna na vida em sociedade. Então, nós vivemos ainda esse processo de tentativa de acomodação com dignidade”.

A aposentada Maria das Graças Victório, 68, afirma que o valor recebido da aposentadoria é insuficiente para manter o orçamento pessoal equilibrado. "Não há como contar apenas com o benefício concedido pela Previdência Social. É bastante difícil sobreviver com um salário mínimo, até por conta dos remédios que temos que comprar todo mês, dos gastos com a saúde que comprometem boa parte do nosso salário. Então, para nós idosos é muito importante voltar a trabalhar, mesmo que não tenhamos condições físicas para exercer determinados cargos em uma empresa".

Maria das Graças Victório acredita que a requalificação profissional é necessária para o retorno de idosos ao mercado de trabalhar. "Eu afirmo sempre que, se a pessoa tiver vontade de voltar a trabalhar e se capacitar, requalificar profissionalmente para isso, ela vai conseguir ser recolocada no mercado de trabalho e, com isso, ampliar a renda, manter as contas em equilíbrio e, principalmente, voltar a ter a sensação de estar ocupada".

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