VIOLÊNCIA CONTRA INDÍGENAS

Mato Grosso do Sul ocupa o terceiro lugar entre estados com mais mortes de indígenas do Brasil

Relatório anual de Conflitos no Campo Brasil, produzido pela Comissão Pastoral da Terra, registrou 63 conflitos por terra e seis mortes de indígenas em áreas de retomadas no Estado em 2022

Clara Farias, Maria Eduarda Schindler e Rafaella Moura24/05/2023 - 14h14
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Mato Grosso do Sul é o terceiro estado que mais contabilizou mortes de indígenas no campo em 2022. A Comissão Pastoral da Terra (CPT) no Estado registrou conflitos por terra e pela água, trabalho análogo a escravidão e tentativas de homicídio e ameaças de morte contra pessoas indígenas. Cerca de 40 mil pessoas se envolveram nos conflitos ocorridos.

Os estados que mais registraram mortes foram Maranhão e Rondônia com sete casos, seguidos de Mato Grosso do Sul, com seis, Pará e Roraima com cinco. Mato Grosso do Sul contabilizou 63 conflitos por terra em 2022. O número de conflitos registrados representa um aumento de 75%, em relação a 2021, em que foram feitas 36 ocorrências no Estado.

Os dados referentes aos conflitos em 2022 foram divulgados durante a “Campanha Nacional Contra a Violência no Campo” e foram mapeados por meio da publicação anual de Conflitos no Campo Brasil realizada pela Comissão da Pastoral da Terra (CPT). De acordo com o agente da CPT em Mato Grosso do Sul, Roberto Carlos de Oliveira são dois tipos de levantamentos registrados no relatório. “Os dados mostram a violência que o latifúndio provoca nos povos do campo, então registramos a violência contra os povos e a resistência deles frente a esta opressão”. Oliveira afirma que há necessidade da demarcação das terras por meio da articulação entre o Governo, latifundiários e indígenas das terras para diminuir os conflitos.

Primeira Notícia · O agente da CPT no MS, Roberto Carlos comenta os interesses políticos na não demarcação de terras

De acordo com o subsecretário de Políticas Públicas para População Indigena, Fernando de Souza é preciso conhecer a história do Mato Grosso do Sul para entender os conflitos que ocorrem pela retomada. “Entre 1910 e 1920 após a Guerra do Paraguai, os povos indígenas foram retirados de seus territórios, à força, e reunidos em uma área denominada ‘reserva’. O governo então repartiu aqueles territórios com fazendeiros. Isso está muito fresco na memória dos povos indígenas".Souza afirma que a visita da ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara na área de retomada Laranjeira Nhanderú, no Mato Grosso do Sul, fomentou a criação do Grupo de Trabalho de responsabilidade do Governo Federal para a retomada de estudos sobre a demarcação de terras dos povos indígenas do Estado.

O subsecretário completa que a Polícia Militar (PM) atua nas áreas de conflito, pois é a força de segurança responsável por atender todos os sul-mato-grossenses. “O fazendeiro se assusta com uma pessoa estranha em sua propriedade e chama a PM. O que ocorre, é que muitas vezes a Polícia acaba excedendo a força, e o aparelho do Estado é bem mais potente”. Souza aponta que neste ano serão criadas mais cinco unidades. Outra medida proposta pelo secretário para diminuir a violência no campo é a criação de um comando especial de policiais militares que atuem nos territórios indígenas. 

O advogado do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Anderson Santos expõe que a maioria dos territórios indígenas demarcados apresenta baixos indicadores de conflito. “A não demarcação é o principal fator gerador de conflito. A ação padrão para evitar o conflito durante uma retomada, é expor os violadores e as violações, e articular uma rede de autoproteção com órgãos públicos e sociedade civil”. 

Segundo Santos, cerca de 20 lideranças indígenas foram assassinadas no Mato Grosso do Sul nas últimas duas décadas. O advogado relata que há um desinteresse do Governo Federal e das forças policiais em solucionar os casos devido ao racismo estrutural. “No caso da líder Xurete Lopes (que faleceu em 2007, durante um confronto com fazendeiros), o ônibus que transportou ela até o asfalto possuía identificação de uma empresa de agronegócio. A Polícia Federal fez a perícia no ônibus somente quatro anos depois”.

O professor de História e membro da coordenação da Aty Guasu - Assembleia Geral Guarani-Kaiowá, Jânio Kaiowá relata que Mato Grosso do Sul possui um alto índice de suicidio entre os povos originários influenciado pela falta de demarcação. “A maioria dos jovens que tiram a vida estavam vivendo à beira da estrada. Outra situação que pode influenciar é a quantidade de agrotóxicos que são despejados próximos aos territórios indígenas”. Jânio Kaiowá pontua que a criação do Ministério dos Povos Indígenas trouxe uma visibilidade para a causa.

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