OCUPAÇÃO

Prefeitura derruba casas construídas por famílias em terreno público

Cinco áreas foram ocupadas por famílias na Capital desde o início de 2017

Danielle Mugarte, Larissa Ferreira e Maria Carolina Lins23/01/2017 - 01h03
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Moradores que ocupam terreno público no bairro Montevidéu em Campo Grande têm que sair de suas casas hoje, dia 23. Na quarta-feira, 18, a Secretraria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano (Semadur) e a Agência Municipal de Habitação de Campo Grande (Emha) derrubaram casas de alvenaria, desocupadas, que foram construídas por famílias que chegaram no local há seis meses. As pessoas que estavam em casa, foram notificadas com um aviso prévio de cinco dias para desocupar o terreno.

No mês de janeiro, cinco áreas da capital, nos bairros Los Angeles, Montevidéu, Estrela Dalva, Taquarel Bosque e Paulo Coelho Machado foram demarcadas por famílias que reclamam da demora na entrega de casas pela Emha. Segundo o diretor-presidente da Emha, Enéas José de Carvalho para obter uma casa pelo órgão é necessário se inscrever no Cadastro Único, um programa criado pelo Governo Federal que identifica famílias de baixa-renda, na Secretaria de Assistência Social e na Emha.

O diretor explica que o processo da entrega das casas, para os que estão na fila, é feito por sorteio e atende aos critérios do programa Minha Casa Minha Vida. “A família tem que ter renda até 1600 reais, pessoas que moram em lugares de risco e mulheres chefes de família têm preferência, além da quantidade reservada aos PCDs [portadores com deficiência física ou cognitiva]. Nós também estabelecemos três critérios, maior tempo de moradia em Campo Grande, mulheres com o maior número de filhos menores de 14 anos e aqueles que moram perto do empreendimento construído”.

De acordo com Carvalho o déficit habitacional de Campo Grande é de 42 mil pessoas. “Não vamos conseguir atender este número de pessoas. Mas nós temos a missão de atingir o maior número de unidades habitacionais para atender o maior número de pessoas”. Ele afirma que a demora na entrega das casas é devida ao crescimento populacional da Capital. “Novas inscrições na Emha são feitas rotineiramente”.

Fonte: Agência Municipal de Habitação (Emha)

O diretor da Emha afirma que, segundo a Legislação Municipal de Campo Grande, quem ocupar irregularmente espaços públicos fica inabilitado de participar de programas habitacionais por quatro anos. "Essa é a forma de não prejudicar aqueles que estão na fila e pagam aluguel".

Carvalho afirma que o caso das famílias que há seis meses ocuparam um terreno público no bairro Montevidéu, onde casas inacabadas foram derrubadas no dia 18 de janeiro, foi a terceira ocupação irregular no local desde 2002. Ele ressalta que a Emha, a pedido da Prefeitura, busca uma solução para as famílias que vivem no espaço e explica que é injusto com os que aguardam sem ocupar terrenos.

Segundo Carvalho, o município tem o direito de desocupar espaços públicos apropriados por essas pessoas. "A municipalidade goza de uma prerrogativa chamada desforço imediato em legítima defesa da posse, qualquer pessoa também tem esse direito se tiver seu terreno invadido".

Carvalho afirma que o papel da Agência é inibir as ocupações e buscar uma solução para as que estão instaladas. "Uma favela é um aglomerado em condições de habitabilidade subnormal. Quando acontece uma invasão conjunta em forma de aglomerado, ela deixa de ser caracterizada como invasão e torna-se um problema social de habitação”. Para Carvalho, favelas podem ser criadas se locais ocupados forem regularizados.

Direito à moradia

O professor do curso de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Aurélio Briltes explica que de acordo com a Constituição Federal, a moradia é um direito básico e fundamental para todos os cidadãos. Ele afirma que um dos objetivos do Estado é criar programas para garantir o acesso a moradia às pessoas que não conseguem esse direito. De acordo com Briltes, se a pessoa não se enquadrar nos critérios definidos pelo Governo, para adquirir uma moradia, ela deve buscar um financiamento privado. "Em tese, como se trata de uma propriedade, se a pessoa não se enquadra, ela então possui condições de arcar com financiamento particular".

Briltes diz que ocupações são ilegais. Foto: Danielle Mugarte

Briltes diz que o principal motivo de várias pessoas estarem na lista de espera por muito tempo é a grande procura e a pouca oferta de novas habitações. "Estamos falando em um gerenciamento de crise. Este problema deve ser gerenciado pelos órgãos governamentais e assim proporcionar este mínimo de sobrevivência para essas pessoas". Segundo o professor, existem três principais medidas que devem ser tomadas para solucionar o problema. Primeiro, verificar quem são as pessoas que precisam dessas moradias, depois se os requisitos contemplam essas pessoas, e, por último, fiscalizar a execução do programa. "Se a pessoa for injustiçada de alguma forma na hora da distribuição, deve procurar a justiça. A demora para conseguir uma casa não é uma violação ao direito à moradia".

De acordo com Briltes, se os donos do terreno recorrerem a justiça com um pedido de reintegração de posse e vencerem, os ocupantes serão obrigados a deixar o local e receberão uma notificação com um prazo para retirarem seus pertences. "Se os moradores não estavam sabendo da notificação, uma hipótese é que alguém recebeu a intimação e não falou nada para ninguém. A gente tem que ver todas as possibilidades, não vamos ser inocentes. Se isso acontecer, a polícia pode chegar lá e as pessoas estarem desprevenidas, mas a justiça e a polícia estavam avisadas que deveria acontecer".

Ocupações

A dona de casa Daiane da Silva Martins faz parte das 27 famílias que ocuparam outro terreno no bairro Montevidéu no dia 13 deste mês. Ela diz que espera há sete anos na fila do Ehma para conseguir uma casa. "Falam que é sorteio, mas quando acontece esse sorteio ninguém sabe. Eles fazem o sorteio entre eles e só ligam pra avisar".

Ocupantes vigiam terreno demarcado. Foto: Danielle Mugarte

Ela afirma que o terreno ocupado é uma propriedade particular e que o grupo pretende disputar com o proprietário na justiça. "Aí tem que ver se o dono tá com o imposto em dia. Porque do mesmo jeito que ele vai pagar pra ficar aqui, a gente também vai". De acordo com Daiane Martins, antes de ocupar o local, as famílias responsáveis pela ocupação verificaram com os vizinhos que o terreno está em desuso há 30 anos. "Os vizinhos nos apoiam, porque eles falam que nesta área tem muito usuário de droga ou assaltante escondido e também mosquito da dengue". 

Daiane Martins explica que para evitar desentendimento com os vizinhos, foi proibido construir casas de madeira ou lona no local. As casas construídas no terro devem ser de alvenaria. Ela também diz que o terreno está sobrecarregado de novos moradores. "Aqui deveriam ter apenas 15 lotes, mas dividimos em um tamanho menor para cada casa, pois assim cabe todas as 27 famílias.Vamos ver o que vai dar, se tiver dono, vamos esperar ele vir. A prefeitura a gente acha que não, porque se não já tinha notificado a gente". Ela explica que alguns vizinhos chamaram a polícia quando eles ocuparam o local. "Como não fizemos casa ainda, então não foi considerado invasão. A policia só veio aqui e pegou o nome do pessoal que ocupou".

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