MEIO AMBIENTE

Plantio de eucalipto para indústria de celulose causa impactos ambientais

As plantações de eucalipto provocam a degradação do solo, coloca em risco a biodiversidade dos biomas da região e causam contaminação e escassez dos recursos hídricos

Luiza Vonghon, Marcus Gonçalves, Mariana Brito e Mariana Piell28/09/2023 - 11h18
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O plantio de eucalipto em Mato Grosso do Sul ocupa um milhão e quinhentos mil hectares na região Leste do estado e compromete a biodiversidade nas áreas ocupadas. As lavouras da espécie atendem a demanda das indústrias de celulose implantadas nos municípios de Ribas do Rio Pardo, Inocência e Três Lagoas. O eucalipto começou ser plantado na década de 1970 e hoje ocupa 99,36% da região Leste.

A extensa área de cultivo provoca desequilíbrio no ecosistema da região, com característica de mata de cerrado e exploração pecuária com plantio de pastagens. O uso de espécie exótica prejudica o manejo do solo e contribui para as mudanças climáticas. A cultura do eucalipto foi introduzida na região para produzir matéria prima para a produção de papel. O eucalipto é uma planta nativa da Austrália que exige um consumo significativo de água para o seu plantio, o que ocasiona a redução dos recursos hídricos regionais. 

Os eucaliptos utilizados para extração da celulose reduzem o número de emissões de dióxido de carbono (CO2) em comparação com áreas destinadas ao plantio de outras culturas como milho. O governo do Mato Grosso do Sul utiliza do plantio de eucalipto para atingir a meta de carbono neutro até 2030. O  governo do estado se comprometeu a zerar as emições de carbono no estado até 2030, na Conferência das Nações Unidas

Pesquisa, baseada nos estudos do carbono neutro, identificou as práticas que atuam como fontes e sumidouros das emissões de gás carbônico. De acordo com o professor do curso de Agronomia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS),  Paulo Eduardo Teodoro é possível medir a absorção da radiação solar e a emissão do gás pelo solo. Por meio dos dados obtidos é desenvolvido um modelo matemático para uso de satélites.

O diretor executivo da Associação Sul-Mato-Grossense de Produtores e Consumidores de Florestas Plantadas (Reflore - MS), Benedito Mário Lázaro explica que o objetivo é plantar os eucaliptos na região onde existem áreas de pastagem degradadas. "O primeiro trabalho que nós fizemos foi fazer um levantamento do estoque de quanta madeira plantada nós tínhamos e chegamos a conclusão que tínhamos 90 hectares, hoje temos um milhão e 400 mil, um milhão e 500 de área plantada".

Lázaro enfatiza que na região o plantio de eucalipto aumentou para atender as necessidades de produção de duas fábricas de celulose em Ribas do Rio Pardo. "As indústrias chegam a produzir dois milhões e 500 mil de toneladas de celulose por ano, número que representa uma área em um milhão e 700 mil hectares de madeira plantada. O eucalipto demora sete anos para ser cortado e essa é a matéria prima. Então a gente entende que as empresas que são associadas à Reflore elas têm esse interesse para suprir as necessidades da fábrica".

Segundo o diretor executivo, o estado produz cerca de cinco milhões de toneladas de celulose anualmente. "Além de servir de matéria prima, o eucalipto sequestra mais em relação aos outros biomas. Só no sequestro de carbono, estamos vendo que a pegada é muito mais positiva. Nós trabalhamos com empresas que têm a certificação do Florestry Stewardshiop Council (SFC) um selo que garante gestão sustentável da produção florestal e é uma conexão confiável entre a produção e o consumo responsável de produtos florestais". Lázaro pontua que o plantio de eucalipto em Mato Grosso do Sul contribui para a preservação e diversificação da fauna e flora da região.

O biólogo e doutor em EcologiaJosé Maria Gusman Ferraz explica que o sequestro de carbono dos eucaliptos é temporário quando as plantas cultivadas são destinadas para utilização das indústrias de celulose. "O eucalipto é removido a cada cinco ou seis anos e com o corte o carbono acumulado é liberado e volta para a atmosfera". O biólogo destaca que as plantações de eucalipto consomem grande quantidade de recursos hídricos devido ao seu crescimento acelerado. "Extensas áreas de eucalipto exigem um consumo de água enorme. O local que antes era um gerador passa a ser uma fonte de drenagem de água, ou seja, de perda de água. E com isso você tem o desaparecimento de córregos, nascentes e redução da evasão de rios grandes". 

Segundo Ferraz, o estudo que aponta o plantio de eucalipto como solução para redução de carbono é tendencioso. "O estudo mostra que ainda não foram analisados os estoques de carbono que ficam nesses sistemas. O ideal é que se analisasse toda a cadeia ao longo do tempo. Senão fica uma coisa muito tendenciosa e parece que estão incentivando a retirada de mata e de outras formas de produção para o plantio de eucalipto, que é uma monocultura extremamente complicada em termos ambientais".

Com base nas informações da pesquisa realizada pelo professor da Zhejiang A & F University, Huaqiang Du a quantidade de dióxido de carbono emitida nos biomas do estado é calculada pelos usos e ocupações do solo, assim como os tipos de vegetação nativa, pastagens, e a presença de culturas de soja e eucalipto. O plantio de eucalipto é a cultura que produz a menor quantidade de emissão de gás carbônico nos biomas do Cerrado, Mata Atlântica e Pantanal.  Os estoques de carbono no solo são indicadores em termos de mudança climática.

O consultor técnico da Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), Clóvis Ferreira Tolentino Júnior explica que é possível obter os índices de aumento e redução da emissão de dióxido de carbono por meio da análise da atividade agrícola e industrial do estado. "Nós temos condições de dizer se vai ter uma redução, aumento, ou uma neutralidade nas emissões. É interessante citar que existem atividades que emanam CO2 e existem atividades que sequestram CO2 e retiram o CO2 do ambiente. No caso do cultivo de eucalipto e atividade florestal como um todo, as plantas retêm o gasto carbônico, retém o CO2".

Tolentino enfatiza que o plantio de eucalipto em Mato Grosso do Sul segue uma regra de zoneamento agroecológico previamente estabelecida pelo governo do estado. A medida consiste em delimitar as áreas que favorecem o plantio sem que ocorra degradação da vegetação nativa. "O cultivo florestal aqui no estado, a gente pode dizer que ele é relativamente novo quando comparado com a agricultura e pecuária. Cultivar árvores é diferente de cultivar grama, é diferente de cultivar pasto. Então, é complicado para um produtor ter de fato um cultivo de eucalipto que possa dar retorno, que possa de fato sequestrar carbono, que possa cumprir as exigências de zoneamento". 

O biólogo e pesquisador em Biodiversidade Douglas Alves Lopes explica que a introdução de uma planta exótica no Brasil, como o eucalipto, prejudica o funcionamento do ecossistema local. "O eucalipto é uma planta nativa da Austrália. Então quando se investe em uma estratégia para reduzir a emissão de carbono utilizando uma espécie exótica, a gente tira o foco de espécies que estão muito melhor adaptadas a realizar esse mesmo tipo de serviço ecossistêmico, como as nossas matas nativas". O pesquisador destaca que a preservação da flora local é a melhor alternativa para a conservação do meio ambiente. "Seria muito mais interessante não só para reduzir a emissão de carbono, mas também para a gente manter a nossa biodiversidade local, ampliar os nossos esforços de conservação, seja na flora ou na fauna. A gente poderia estar investindo na preservação de espécies ameaçadas da flora que fazem também muito bem essa função".

Lopes explica que as plantações de eucalipto são prejudiciais porque colocam em risco o desenvolvimento de outras espécies nativas. Segundo o biólogo, o eucalipto utiliza a alelopatia no ambiente para impedir o desenvolvimento de outras espécies. "Quando você tem a monocultura, uma única espécie dominando no ambiente, e além de tudo uma espécie que é exótica, ela comporta muito menos espécies nativas da fauna, de insetos, de polinizadores". 

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