INCLUSÃO

Número de alunos surdos matriculados duplica na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Equipe de intérpretes disponível para o acompanhamento dos acadêmicos é a mesma desde 2007

Amanda Raíssa, Evelyn Mendonça e Jéssica Lima22/10/2019 - 12h52
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A Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) registrou aumento de três para seis no número de alunos surdos no campus de Campo Grande no primeiro semestre letivo de 2019. As cotas de entrada na Universidade estão previstas no Art. 4º do Decreto nº 5.296. De acordo com a Divisão de Acessibilidade e Ações Afirmativas (DIAAF), 30 alunos são autodeclarados com surdez ou deficiência auditiva matriculados na UFMS, na capital e no interior do estado. O número de intérpretes disponíveis para o acompanhamento dos acadêmicos é mesmo desde 2007, com seis na capital e 14 nos demais municípios. 

O Censo da Educação Superior de 2017, divulgado pelo Ministério da Educação (MEC) e apurado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (Inep) aponta que há 2.138 alunos surdos matriculados no ensino superior no país. De acordo com a pesquisa, 5.404 acadêmicos foram autodeclarados com deficiência auditiva. De acordo com documento divulgado pela Secretaria de Educação Especial (Seesp), a deficiência auditiva é a perda de até sessenta decibéis e a surdez varia entre a perda de setenta a mais de noventa decibéis da percepção sonora.

A pedagoga especializada em Língua Brasileira de Sinais (Libras), Driele Borges trabalha como intérprete desde 2007. Ela explica que o ensino para surdos está consolidado na educação básica porque é realizado há mais tempo e que a inclusão é recente no ensino superior, especialmente em universidades públicas. "No ensino superior, o intérprete não tem como dominar todas as áreas do conhecimento, como Medicina Veterinária, Arquitetura e outros, então trabalha exclusivamente na tradução do que é dito pelo professor".

Intérprete de libras destaca a importância da inclusão dos surdos na Universidade (Foto: Amanda Raíssa)

Driele Borges possui experiência no ensino para diferentes faixas etárias e explica que os trabalhos são distintos. "No caso da educação infantil, o intérprete trabalha como instrutor mediador, já que é necessária uma mediação da língua. O aluno surdo muitas vezes vem de uma família de ouvintes que não sabem nem estão aprendendo libras, por isso chega na escola sem conhecer nem a língua de libras, nem a língua portuguesa".

A intérprete diz que as demandas recebidas são diferentes em cada semestre e dependem dos horários das disciplinas dos cursos e do número de alunos na UFMS. "Este ano entraram três alunos novos, então o número de aulas duplicou. O número de intérpretes impossibilita que sejam atendidas todas as aulas, principalmente porque trabalhamos em dupla para fazer os revezamentos". Ela explica que a equipe tenta manter cada intérprete em uma disciplina, o que nem sempre é possível, devido a carga horária que deve ser a mesma para todos.

O aluno do segundo semestre do curso de Audiovisual da UFMS, Wedyn Pereira é surdo e ressalta que sempre teve contato com alunos ouvintes no ensino fundamental e médio. “No primeiro ano do ensino médio, eu já tinha muito contato com os ouvintes e tentava ensinar um pouco de libras para eles, por meio de livros. Na Feira de Tecnologias, Engenharias e Ciências (Fetec), desenvolvemos um projeto com a orientação de professores, onde criamos uma espécie de dicionário, e criamos um jogo de química onde também envolvia o ensino do conteúdo e língua de sinais, para que eles também pudessem aprender”.

Pereira explica que o processo de entrada na Universidade foi difícil e que recebeu o apoio de seus familiares durante o processo. “Eu escolhi o Audiovisual porque gosto muito da área de fotografia e de novelas. A prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é difícil porque exige muita leitura, mas onde senti mais dificuldade foi na redação. Quando vi que eu entraria em uma Universidade, fiquei até surpreso e feliz, eu e minha família ficamos muito felizes por eu ter conseguido ser aprovado”.

O acadêmico afirma que recebeu auxílio de intérpretes que possibilitaram o aprendizado durante o ensino básico. “Nas escolas, sempre todos eram ouvintes, e apenas eu era surdo. Sempre tive o acompanhamento de intérpretes, e só com esse auxílio eu conseguia aprender o que estava sendo dito”. Ele ressalta que outras ações para o ensino de libras para os colegas de classe são necessárias durante os anos de estudo.

O professor do curso de Audiovisual da UFMS, Júlio Bezerra explica que ministrar a aula para um aluno surdo é desafiador, principalmente por precisar ter uma boa relação entre o intérprete e professor. “Você tem que ter uma relação de confiança com aquele intérprete, e é difícil porque eu não sei se ele está entendendo o que eu estou explicando, então eu não tenho controle daquilo que ele está passando para o aluno”.

Bezerra ressalta que nas reuniões do curso de Audiovisual os professores debatem sobre o assunto, e que conseguiram oferecer uma disciplina de língua portuguesa para os alunos surdos. “Conseguimos oferecer para os alunos surdos, a disciplina de língua portuguesa como segunda língua. E no final do semestre iremos avaliar e ver se surtiu algum efeito. No caso do aluno de Audiovisual, o Wedyn, é um pouco mais agravante, pois ele é indígena, então a língua portuguesa é a terceira língua dele”.  

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