A Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (Progep) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) começou a traduzir e interpretar, por meio de vídeos, os editais de concursos públicos na Língua Brasileira de Sinais (Libras). Os vídeos foram divulgados no YouTube no canal "WEBTV UFMS". A primeira publicação foi a tradução do edital para concurso de docente em Libras.
A tradutora e intérprete de Libras, Driele Borges, uma das responsáveis pela interpretação dos vídeos, afirma que o primeiro edital foi específico para professores de Libras. Ela ressalta que a tradução do edital é um dos primeiros passos para melhorar a acessibilidade das pessoas surdas na UFMS. “O edital é uma vertente. Tem várias coisas que a gente precisa organizar. A lei fala, por exemplo, sobre artigos interpretados”.
A professora de Libras, Raquel Quiles trabalhou na comissão geral do concurso e explica que é necessário que os editais sejam traduzidos em Libras porque as pessoas surdas podem ter dificuldade para compreender determinados termos da língua portuguesa. “O edital em si tem especificidades que para qualquer um que vai ler fica em dúvida. Quando um surdo vai ler esse edital na sua segunda língua, que é a língua portuguesa, apesar dele ter domínio, tem muitas dúvidas que vão ser colocadas para eles”.
Segundo Driele Borges, a tradução do edital é respaldada na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, 13.146/15. “Isso é uma lei. Dentro desta lei, explica que todos os editais e suas retificações têm que ser interpretados”. Ela explica que por causa da falta de estrutura e profissionais, não é possível viabilizar a tradução de todos os editais. “Só somos dois intérpretes aqui na Universidade, então todos a gente não consegue”.
O chefe da Promotoria de Direitos Humanos, Eduardo Cândia explica que a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência reforça o texto da Constituição Federal que garante, no artigo 5º, igualdade entre todas as pessoas. “Para haver igualdade, deve-se respeitar a desigualdade, tratando desigualmente os desiguais.” Para Cândia, a Lei prevê a acessibilidade como forma de inclusão social. “Ela (a lei) garante a acessibilidade não apenas física, como o acesso a um prédio, mas no sentido mais amplo possível, como, por exemplo, acesso ao lazer. A questão é de interpretar e mais do que isso, aplicar a Constituição. Isso inclui ter acesso ao edital de um concurso, de uma forma independente e autônoma”.
Cândia afirma que as pessoas prejudicadas pela falta de acessibilidade têm o direito de acionar o Ministério Público. De acordo com Eduardo Cândia, entre as dificuldades de promover acessibilidade estão o custo financeiro, para adequar estruturas e contratar profissionais especializados, e também a falta de conscientização das pessoas. “É um debate novo, há 15 anos ninguém falava sobre isso”.
Driele Borges explica que a equipe irá priorizar a tradução de editais com maior demanda de surdos. Ela afirma que o processo de interpretação, gravação e edição do vídeo é exaustivo. “Como a gente não vai dar conta de fazer todos mesmo, e um edital demora um dia ou um dia e meio pra interpretar. Aí tem a parte de edição que é mais três ou quatro dias. Não é assim, vamos fazer e pronto”. Segundo a intérprete, as prioridades são os concursos públicos. “É onde a comunidade surda pode precisar e, talvez, pós-graduação. Porque essa comunidade hoje em dia já está formada, quer fazer o mestrado e na hora de ler o edital não tá acessível pra essa comunidade”.
A professora de Libras, Raquel Quiles afirma que a publicação dos editais em Libras é importante para a sociedade. “Quando a gente faz isso em Libras, você tá garantindo o direito linguístico dessa pessoa de acessar um edital na sua primeira língua”. A professora ressalta que existe um debate para que os editais dos programas de pós-graduação sejam, no futuro, publicados em Libras. “Então já tem essa negociação com a Propp para que quando saia qualquer edital de pós-graduação da Universidade, o intérprete seja convidado para que ele possa fazer em Libras”.
De acordo com Raquel Aquiles o termo surdo-mudo deixou de ser utilizado pelos pesquisadores, professores e intérpretes em Libras e pela comunidade surda. Ela explica que surdez e mudez são deficiências diferentes.