JORNALISMO

Mato Grosso do Sul é o quarto estado em quantidade de veículos de comunicação por 100 mil habitantes

Governo do estado avalia projeto de Marco Regulatório para organizar estrutura de mídia e qualificar os profissionais de jornalismo

Amanda Raíssa, Evelyn Mendonça e Jéssica Lima 9/11/2019 - 15h22
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Mato Grosso do Sul é o quarto estado com mais jornais impressos e cibermeios jornalísticos a cada 100 mil habitantes, conforme levantamento do Atlas da NotíciaCampo Grande ocupa a 11ª posição, com 33 veículos mapeados na lista de cidades na mesma categoria. Os dados colocam o estado como uma das maiores redes de difusão de notícia. Pesquisa realizada no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul mostra que o estado possui mais de 400 cibermeios jornalistíscos em 79 municípios.

O subsecretário de Comunicação do Estado, Francisco Victório analisa os dados da pesquisa e o relatório do Atlas da Notícia e ressalva a importância e necessidade de se criar marco regulatório da mídia no estado, de outro lado o Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso do Sul (Sindjor-MS) iniciou um novo censo sobre o mercado profissional para jornalistas.

O professor do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Gerson Luiz Martins explica que a cobertura feita pelo Atlas da Notícia é quantitativa e deixa de associar aspectos como a qualidade da informação. “As informações divulgadas pelo Atlas da Notícia mostram que há uma cobertura jornalística quantitativa, mas esse panorama de muitos cibermeios que estão nas cidades do interior não significa qualidade da informação. Até mesmo muitos cibermeios jornalísticos estão com o nome de uma determinada cidade, mas o proprietário não necessariamente está localizado na cidade que ele diz atender”. 

Martins afirma que a presença de cibermeios jornalísticos é maior do que a de outros meios de comunicação. “Nós temos hoje quatro cursos de Jornalismo no estado, e que atendem perfeitamente a demanda de profissionais qualificados, principalmente nos cibermeios jornalísticos. Eu falo cibermeio porque é a rede maior, maior do que o telejornalismo, radiojornalismo e o jornalismo impresso. Então nós temos jornalistas qualificados, formados, e que podem atender esses cibermeios".

O professor avalia que o jornalismo de proximidade é definido por meio da produção de informação regional e local. “Esse aspecto está muito comprometido, visto que muitos cibermeios do interior do estado fazem a cópia de portais de notícias do Governo do Estado, das prefeituras, da Assembleia, das câmaras municipais e também dos grandes jornais”. 

O jornalista, presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor) e pesquisador do Atlas de Notícias, Francisco Belda explica que o mapeamento de veículos jornalísticos colabora para o estudo dos meios de comunicação. “O Atlas da Notícia é um projeto pioneiro de cartografia do jornalismo no Brasil. Ele fornece um importante parâmetro para se pensar não só a quantidade e a distribuição dos veículos de jornalismo no território nacional mas também permite uma série de correlações entre a existência de veículos de informação profissionais e indicadores de escolaridade, índices demográficos, padrão de vida das populações”.

O pesquisador afirma que os dados registrados expressam uma realidade que serve de base para análises qualitativas e estudos críticos sobre a qualidade da informação oferecida ao público. “O Atlas não fornece um conhecimento pronto, fornece dados e informações valiosas para que pesquisadores de diferentes áreas possam fazer os seus próprios levantamentos. A presença de um veículo de jornalismo apesar de ser fundamental para a circulação da informação, para o diálogo e o debate público naquela localidade, ela por si só não garante a qualidade desse debate”. Ele defende que o jornalismo é importante para localidades municipais desprovidas da cobertura midiática presente nos grandes centros.

Belda ressalta que a transparência nos métodos de apuração, a correta citação das fontes e o oferecimento de opções que permitem o diálogo entre o público e o jornalista são indicadores de credibilidade do jornalismo. “Nesse sentido, é muito importante que nós enquanto comunidade que se dedica à qualificação do jornalismo no Brasil, possamos dar os passos seguintes e procurar cada vez mais promover junto aos veículos de jornalismo, locais ou não, uma cultura de qualidade. Isso é fundamental para a manutenção e a saúde da democracia no país”. 

O subsecretário de Comunicação do Estado de Mato Grosso do Sul (Subcom), Francisco Victório explica que o Governo estuda implantar o marco regulatório da mídia, com objetivo de controlar o número de portais de notícias, que aumenta todos os dias no estado. “O marco regulatório que nós queremos aplicar, é direcionado para mídia, ele não é direcionado para a questão editorial dos jornais. Nós estamos trabalhando para restringir ainda mais essa questão de todo dia ser criado um novo site de notícias, o qual geralmente é de conteúdo duvidoso”. 

Victório afirma que o marco regulatório foi planejado para que a próxima geração de jornalistas tenham melhores condições de trabalho. “Nossa esperança é essa, embora tenha todo um contexto atual das mídias sociais que estão restringindo um trabalho nosso, porque há uma insatisfação geral na sociedade, tanto na questão política quanto econômica, e quem acaba sofrendo com isso é o bom jornalista”. 

O subsecretário explica que Mato Grosso do Sul será pioneiro na criação do marco regulatório da mídia. “Quando você propõe uma mudança dessa, no qual rompe com uma relação de muitos anos, vai ser uma ruptura muito traumática, no qual teremos que pagar o preço por isso. Nós estamos nos espelhando na presidência da república e vamos nos adaptar a nossa realidade. Já faz um ano que estamos conversando sobre o assunto, e para isso precisamos de aprovação da Assembleia”.

Paulo Yafusso explica que municípios precisam de jornalistas qualificados (Foto: Evelyn Mendonça)

O editor-chefe da Subcom, Paulo Yafusso explica que a mídia está concentrada nos grandes centros, e que os municípios menores carecem de profissionais qualificados. “Se você analisa os municípios de menor porte, eles ficam atrelados justamente à criação de sites e réplica de notícias que outros sites produziram. O bom jornalismo está restrito aos grandes centros”.

Yafusso ressalta que os conteúdos de muitos cibermeios jornalísticos são publicados pelos proprietários dos veículos, o que dificulta as vagas de emprego para profissionais formados na área. “Existem muitos sites que hoje quem monitora é o próprio dono, e com isso, não se gera mais empregos. Então, o site é abastecido por material das assessorias. Não tem um jornalista para trabalhar na apuração no qual analisa os dois lados, produzir uma matéria com uma avaliação mais crítica, ou até uma maior contextualização do assunto”.

De acordo com último censo realizado pelo Sindicato dos Jornalistas de Mato Grosso do Sul (Sindjor-MS), 65,6% dos jornalistas estavam desempregados em 2017 e menos de 30% eram sindicalizados. O presidente do Sindicato, Walter Gonçalves explica que o novo censo possui pontos mais aprofundados do que o anterior, e aborda questões de gênero e assédio para ter um perfil próximo da realidade da profissão no estado. O antigo censo contou com 308 participantes e foi realizado de 21 de maio a 31 de junho. O presidente diz que espera um número maior de respostas para a edição de 2019.

Semana Acadêmica de Jornalismo

A Semana Acadêmica de Jornalismo (Semajor) organizada pelo curso de Jornalismo da UFMS marcou a comemoração de 30 anos do curso na Universidade, fundado em novembro de 1989. O tema central foi “Desafios editoriais e novos modelos de negócios” para o jornalismo. A programação teve palestras que debateram a situação atual do mercado profissional e a relevância da produção do jornalismo local.

O jornalista e editor responsável pelo projeto Atlas de Notícias, Sérgio Spagnuolo foi palestrante do evento e participou do debate sobre jornalismo local e novos modelos de negócios. Ele afirma que as mudanças no jornalismo refletem em novos desafios para os antigos e novos profissionais. “Existe uma crise no modelo de negócio que está realocando o jeito que as redações empregam e também refletem nas condições de trabalho. Não quer dizer que está bom, ruim ou melhor, quer dizer que tem mudanças”. 

Spagnuolo explica que o surgimento de novos empreendimentos no jornalismo pode se associar às mudanças ocorridas na organização do mercado jornalístico. “Se todo mundo que é jornalista abrir uma iniciativa jornalística, nós vamos ter 150 mil iniciativas jornalísticas. O empreendedorismo nessa questão é um pouco mais útil para percebermos essa mudança de paradigma no modelo de negócios do jornalismo”.

A jornalista e co-fundadora da Énois, agência de produção jornalística que desenvolve projetos sociais na periferia de São Paulo, como a Escola de Jornalismo para jovens dessas localidades, Nina Weingrill também participou da mesa redonda sobre jornalismo local e explica que a análise das redações de jornais devem ser pensadas em contextos. “O interessante é entender que nos grandes jornais, não mais tão grandes, há uma grande perda do número de correspondentes. O conceito de ‘deserto de notícias’ [regiões com ausência ou baixa presença de veículos de jornalismo] é muito interessante, porque precisamos pensar em como esses veículos estão cobrindo esses espaços que basicamente foram deixados à mercê do nada. É preciso haver um trabalho complementar entre os pequenos e grandes veículos”.

Nina Weingrill ressalta que espera uma distribuição melhor dos profissionais e proximidade com o público para o futuro do jornalismo. “Eu gostaria para o futuro do jornalismo que todas as pessoas conhecessem um jornalista pessoalmente. Que todo cidadão pudesse ter a oportunidade de ter o telefone de um jornalista, de poder se comunicar com ele". 

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