PESCA

Decreto Cota Zero altera regras para a pesca em Mato Grosso do Sul

A legislação também impõe uma nova delimitação de tamanho máximo e mínimo para pescados e institui que a pesca amadora e desportiva só poderão ser praticadas no sistema “pesque e solte”

Caio Teruel, Marcos Saucedo, Mylena Fraiha27/04/2019 - 12h51
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O decreto Cota Zero, sancionado pelo governador Reinaldo Azambuja, regulamentará a pesca no rios de Mato Grosso do Sul. A partir de 2020 pescadores amadores e desportivos serão proibidos de capturar peixes nos rios do estado e levá-los para outros locais. A legislação também impõe uma nova delimitação de tamanho máximo e mínimo para pescados e institui que a pesca amadora e desportiva só poderão ser praticadas no sistema “pesque e solte”. 

Para os pescadores profissionais foi definido um limite de 400kg mensais de pescado. Este decreto foi sancionado no dia 21 de fevereiro e entrou em vigor pela publicação no Diário Oficial do Estado no dia 22.

Para o deputado estadual Cabo Almi (PT), propositor da Audiência Pública Cota Zero: A cadeia produtiva da Pesca em debate, realizada no dia 21 do mês passado, o decreto precisa ser reavaliado e debatido com os setores envolvidos. "O governador publicou este decreto que de imediato tinha a determinação de suspender a pesca nos rios de Mato Grosso do Sul, já no ano de 2019 pelos pescadores amadores e profissionais e tivemos a responsabilidade de fazer o debate através dos setores responsáveis como Embrapa, pescadores, empresários e ribeirinhos". 

Segundo o deputado, o decreto culpabiliza e ao mesmo tempo afeta os pescadores, em especial os profissionais que necessitam da pesca como meio de sobrevivência. “É preciso entender que a falta de espécies nos nossos rios e a falta de repovoamento, ela não se dá pura e simplesmente através do pescador. Ao contrário, nós temos o entendimento que, no caso do pescador amador deixar de pescar nos nossos rios, nós iremos prejudicar a economia do estado. Iremos criar desemprego e afugentar os turistas nos rios de Mato Grosso do Sul”. 

Problemas ambientais

 Siqueira explica fatores externos que afetam a saúde dos rios (Foto:Mylena Fraiha)

De acordo com o biólogo e presidente da Organização Não-Governamental Ecologia e Ação (Ecoa), André Siqueira, atualmente a qualidade da água dos rios é mais afetada pelas ações de outros setores, como o agronegócio, do que pela prática da pesca propriamente dita. "Hoje nós temos uma situação bem mais grave de uso e ocupação do solo da bacia, por não respeitarem a mínima legislação que nós temos hoje. Como é o caso da pecuária, que hoje acessa os principais rios da bacia. Temos também a questão dos agrotóxicos, a presença das barragens, o desmatamento de matas ciliares e assoreamento. Então, existe uma série de fatores que realmente geram um impacto irreversível dentro dos rios, muito mais do que você ter a presença de 4.000 pescadores profissionais em um território gigantesco como o Pantanal". 

Siqueira ressalva a necessidade de desenvolver um estudo sobre o impacto do decreto em níveis econômicos e sociais. "Primeiro, precisa ter todo um estudo de quanto isso vai impactar uma economia que é pujante e riquíssima. A pesca é segunda atividade que mais gera emprego e renda no Pantanal, só perde para a pecuária. Então, precisa ser muito bem avaliado, porque as pessoas que sobrevivem da pesca hoje, não possuem nenhum capital”.

Falta de diálogo

Para o presidente da Associação dos Pescadores de Isca Artesanal de Miranda-Apaim, Lieze Francisco Xavier, a elaboração do decreto deveria ter incluído os outros agentes envolvidos no ciclo da pesca. “Ele (governador) deveria antes ter convidado os pescadores de colônia e associações, outros pescadores profissionais, vários amadores, os empresários das iscas, os empresários das peixarias, os biólogos, as universidades, a Embrapa. Colocado todo mundo na mesa para discutir. A pesca não é só o pescador, envolve muita gente”. 

Segundo Xavier, a medida tomada pelo governo foi precipitada e sem embasamento científico. “Se é para o meio ambiente, que faça a coisa certa. Façam pesquisas e tragam dados reais. Nesse cota zero, não apresentaram nenhum dado científico até hoje”. Xavier, com experiência de 36 anos de profissão, destaca outros problemas, como o desmatamento, têm afetado a situação dos rios e a reprodução dos peixes. “O que tá morrendo é o nosso rio. Nosso rio tinha poço de 20 metros de profundidade, agora ele está ficando assoreado por causa de desmate irregular. Além disso, tem também as toneladas de agrotóxico que chegam nos rios e afetam os peixes”. 

Turismo de pesca

Segundo o diretor-presidente da Fundação de Turismo de Mato Grosso do Sul, Bruno Wendling, a implantação da cota-zero deveria ter sido tomada antes, para se alinhar às novas práticas do turismo de pesca e ambiental. Para Wendling, assim como os pecadores, existem outras categorias profissionais que estão envolvidas no circuito econômico do turismo de pesca e que devem se reestruturar e buscar novos tipos de organizações. “Eles, os pescadores, terão que se readequar. Aqueles que não acreditam que a cota-zero é o melhor modelo deve entender que os números mostram que é, eles naturalmente terão que se organizar de forma a atender um novo perfil de turista, aquele que vem buscar destinos que respeitem os seus ativos naturais.”

De acordo com Wendling, caso a cota-zero deixasse de ser implantada, haveria a necessidade de melhorar a situação de turismo de pesca no estado, para qualificar e atender as demandas do mercado. Segundo Wendling, a lei é um passo para a melhoria na qualidade do turismo de pesca no estado. “A pesca é muito importante em termos de imagem do estado, ela pode crescer ainda mais se se trabalhar com turismo responsável, turismo de pesca e solte, esportiva, então acho que pode agregar ainda mais o nosso produto, que já é bem conhecido nacional e internacionalmente.”

 
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