CRÔNICA

Carta de uma privilegiada

Maria Eduarda Schindler27/06/2020 - 17h40
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As coisas estão difíceis, o mundo está do cão. São ameaças de guerra, polarização política, incêndios, vulcões, pandemia, hackers e o racismo.

Sabem a história do lobo vestido em pele de cordeiro? Ela parece com os dias atuais. Aqueles que escolheram defender e proteger a sociedade mostram vestir uma pele de cordeiro, escondendo sua ideologia abusiva e racista, enraizada na história da humanidade, e que parece nunca morrer. Existem aqueles que acham o racismo algo normal, que compreende a estrutura da sociedade de maneira natural e que devemos a aprender como conviver com ele. E elas estão matando e, para passar pelo processo seletivo, basta ser preto.

Bom, isso vocês sabem (...)

O tempo que a luz solar demora chegar à terra é de oito minutos. Se eu soubesse quando ocorreriam meus últimos oito minutos, não sei o que escolheria  fazer, mas tenho certeza que a cor da minha pele não interferiria nas escolhas disponíveis.

Não imagino como é ser sufocada em uma abordagem policial e morrer pedindo para respirar por causa da minha cor – por oito minutos.

Não imagino como é andar por aí com medo de alguém me parar, achando que vou puxar uma arma.

Não imagino como é entrar no mercado e o segurança me seguir, pensando vou roubar uma caixa de leite.

Não imagino como é entrar em um restaurante e ser convidada a me retirar porque os outros clientes sentem-se incomodados com minha presença.

Não imagino como é ser negada na entrevista de trabalho por conta da minha cor.

Não imagino como é ser o único preto na escola e não ter amigos, porque todos têm nojo de mim.

Não imagino como é ter a vida do meu filho tirada prematuramente por causa da cor da sua pele.

Não imagino como é virar uma estatística.

Mas o mundo está acordando, as pessoas estão enxergando seus privilégios e seus abismos.Estão entendendo a problemática da branquitude. Não imaginamos a dor de passar por tanto preconceito, mas  porque aceitamos essa realidade? Elza Soares disse que a carne mais barata do mercado é a carne negra. Por que ela tem que ter um preço?

As chamas pedindo mudança ardem, a bandeira do antirracismo foi hasteada e não voltará a descer pelo mastro. A luta pela igualdade ganhou força e voz. Ruas de diversos lugares do mundo estão cheias de sentimentos de vergonha, de dor, mas também estão clamando justiça pelo sangue já derramado – o sangue de vocês.

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