CRÔNICA

Movimento Associativo do “Agora Não”

Bianca Coelho 1/07/2019 - 19h00
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Abro o jornal no celular, ávida pelo que se tornara a companhia dos meus cafés da manhã apressados e sem gosto. Um cardápio de tragédias e polêmicas estampadas nas páginas diárias. Mais uma mulher assassinada, vítima de uma sociedade que não quis defendê-la; um homem que se jogara da ponte e teve sua morte transmitida ao vivo nas redes socias; um presidente metido a general que manda e desmanda suas ordens vazias, cortando, não somente os gastos, mas também os sonhos do brasileiro.

Deslizo a tela depressa, tentando absorver todo o sangue e a insatisfação que saía daquele jornal, mas a falta de tempo só permite que eles escorram do meu celular e manchem a mesa. Assim como eu, sei que milhares de brasileiros fazem o mesmo, leem, mas não interiorizam o que lhes foi dito. O mais politizado se compadece do feminicídio, mas permanece duvidando da vítima, reclama da educação, comparando-a com um monumento, que mesmo imponente, deteriora-se com a falta de cuidados, mas não a reivindica, quando Bolsonaro declara guerra contra os estudantes.

Paralisados pela rotina, sem força para engajamento, só conseguem assistir ao homem que comete suicídio, à mulher que sofre violência doméstica e ao triste fim da educação pública, sem, contudo, interferir em nenhum desses finais. Saio do jornal e entro nas redes sociais e o cenário é o oposto das ruas, que em dia de insatisfação permanecem vazias. Repleto de textos políticos, em total apoio às causas em voga, o Facebook é um arsenal de politização, que aprisiona a militância à paz de suas residências.

Em um ímpeto de loucura e revolta, me levanto da cadeira e corro ao portão de casa. Penso em começar uma manifestação aqui e agora. Empunhar cartazes na luta pela educação, correr da repressão policial, denunciar casos de abuso, reagir às tragédias que diariamente mancham também um pouco do meu ser. Estava decidido! Eu entraria para o Centro Acadêmico, criaria uma Organização Não Governamental para mulheres vítimas de violência, lideraria revoluções e, finalmente, me engajaria nas causas políticas as quais defendo. A rotina não me desmotivaria a transcender a hipocrisia do ativismo que se restringe ao meio digital.

Ou agora não. Talvez eu devesse voltar para casa, terminar meu café, mudar de jornal, aproveitar o pouco do meu tempo para me apartar da realidade que permeia o cotidiano caótico do Brasil. Pensando bem, uma bala de borracha doeria muito, andar por quilômetros em manifestações e conscientizar a população seria exaustivo à minha falta de tempo. Retornei à cadeira, escrevi um textão destilando toda a minha insatisfação com a situação atual no Facebook e fui trabalhar com o sentimento de dever cumprido.

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