A Assembléia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALMS) instituiu a Campanha de Conscientização sobre os Riscos da Dependência de Aparelhos de Tecnologia Eletrônica devido ao índice elevado de crianças que utilizam tecnologias. A iniciativa foi organizada para debater a nomofobia, medo do indivíduo em ficar impossibilitado de se comunicar por meios digitais, como celulares e computadores. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registrou que 63,8% das crianças e adolescentes entre 10 e 14 anos possuem telefones móveis para uso pessoal na região Centro-Oeste, maior índice nacional de 2015.
De acordo com o levantamento realizado pelo IBGE, houve um crescimento de 3% entre 2014 e 2015 no uso de telefones móveis entre toda a população da região Centro-Oeste e 86,9% dos consumidores são jovens de 25 à 29 anos. A mesma pesquisa registrou, em 2016, que 78,4% dos domicílios da região possuem internet, dados que colocam a região em segundo lugar no consumo de internet em área urbana. Nestas casas, 1,4% dos celulares são inutilizados para acesso à internet.

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O deputado estadual e autor do projeto que institui a campanha por meio da Lei nº5.259, Felipe Orro afirma que o uso excessivo das novas tecnologias altera o comportamento das pessoas e afeta a saúde do usuário que as utiliza. “A maioria dos especialistas das áreas de saúde e psicologia acreditam que o uso excessivo das chamadas novas tecnologias tornam as pessoas mais impacientes, impulsivas e esquecidas, podendo causar danos à saúde de crianças e adolescentes”.
O doutor em teoria psicanalítica e professor do curso de Psicologia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Tiago Ravanello afirma que, atualmente, as crianças têm uma relação social construída por meios digitais. Segundo Ravanello, os pais utilizam as tecnologias como distração para os filhos, durante a realização de suas tarefas. Para o pesquisador, há um entendimento incorreto de que a criança deve estar entretida a todo momento. “Como é que ficam os tempos de espera? Que uma criança tenha que em determinado momento da sua vida, lidar com uma experiência obrigatoriamente de suspensão. Vejam por exemplo, como isso pode estar ligado a um acréscimo de hiperatividade e déficit de atenção”. Ravanello afirma que é inadequado definir normas de saúde para um uso saudável das tecnologias e quem é identificado com a doença deve pedir ajuda a profissionais da saúde mental.
Segundo o psicólogo, a campanha é positiva e toda forma de diálogo sobre o assunto é válido, por criar possibilidades de novos laços sociais. “Elas criam conscientização, a respeito de como a gente atua na relação com o outro. Eu vejo interessante um olhar público pensando, que se não analisarmos o impacto desses meios de informação sobre a sociedade, podemos futuramente ter que correr atrás, para lidar com danos incalculáveis”.
A estudante do terceiro ano do ensino médio, Janaina Espirito Santo afirma que é ativa nas redes sociais, gosta de ler notícias e reportagens. Ela utiliza o computador em casa ou quando o professor encaminha os alunos até a sala de tecnologia para realizar pesquisas. A estudante ressalta que seus colegas fazem o uso inadequado dentro da sala de aula, com a atenção voltada para jogos ou aplicativos de mensagens.
Janaina Espirito Santo relembra que há três meses é independente do celular. A estudante usava, antes deste período, os aparelhos como auxílio nos estudos para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e vestibular. Ela afirma que, em alguns momentos, deixava de estudar para entrar nas redes sociais. A aluna relata que precisou recorrer aos livros para pesquisas durante um período sem celular, por pedido da mãe. “Já fui muito dependente do celular, tanto que ia no banheiro e o levava, ia tomar banho levava o celular, eu estava no meu quarto eu levava o celular, as vezes ele estava com 2% de bateria e eu levava”.
A estudante ressalta que sua preocupação era a necessidade de manter o celular em suas mãos, mesmo sem conectividade com as redes sociais. Ela afirma que se recuperou da nomofobia e voltou a ter interesse pelos livros. “Antes comia com o celular na mão, deixava o prato e respondia todo mundo. Agora, nas refeições, desligo o celular, ou deixo longe, então me considero mais independente da tecnologia”.
A diretora da Escola Estadual Amando de Oliveira, Rita de Cássia afirma que possui 20 anos de experiência na educação. A diretora comenta que atualmente, o uso do celular sem maturidade pelos jovens, com foco na diversão e entretenimento. Para Rita de Cássia, o aparelho é uma ferramenta de pesquisa e aprimoramento que, se usado neste sentido, torna-se benéfico. Para a diretora, a dependência do aparelho celular torna os jovens cada vez mais solitários. “Se essa proposta de palestra, de atividades para fazer com que esse aluno compreenda que ele tem que ter a vida dele, que ele não tem que ser apenas dependente do celular para poder se auto afirmar, para trabalhar sua autoestima, a gente vai estar participando com certeza”.
Segundo Rita de Cássia, a escola trabalha com campanhas de conscientização para os alunos. O colégio ofereceu, recentemente, palestras sobre suicídio e cyberbullying. A diretora e os professores trabalham juntos para ensinar recursos da tecnologia como benefício aos alunos. A escola faz parte do projeto Professor Gerenciador de Tecnologias e Recursos Midiáticos (Progetec), da Secretaria de Estado de Educação (SED), que objetiva incentivar o uso das tecnologias dentro da unidade escolar pelos professores.
A professora responsável pela sala de tecnologias da Escola Estadual Amando de Oliveira, Karen Cristina Godoy percebe que os alunos esquecem dos conhecimentos e benefícios do uso das tecnologias na educação. “Eu falo para os alunos, está com dúvida de alguma aula do professor, aquela explicação difícil de entender, procure uma vídeo aula daquela disciplina, daquele conteúdo. Porque às vezes o professor daquela vídeo aula, a didática dele você entende melhor do que a do professor da sala de aula. Então, assim, tem bastante benefícios para educação”.
O produtor rural João de Oliveira afirma que seus filhos possuem dependência de celulares e que a tecnologia atrapalha o convívio familiar. Para Oliveira, iniciativas como a campanha promovida pela ALMS são relevantes no atual contexto social, devido ao constante uso nesta faixa etária. “Estão na idade de formação de conduta e de consciência e é por aí o caminho. Tem que existir uma informação e cobrança de fora, porque muitas vezes o pai e a mãe ficam como carrascos”.