ENFERMEIROS

Enfermeiros de Mato Grosso do Sul protestam a favor de projeto que institui melhorias trabalhistas

Profissionais de enfermagem relatam que é comum haver sobrecarga de serviço, jornadas longas de trabalho, salários baixos e falta de equipamentos

Alíria Aristides, Lidiane Antunes e Nélida Navarro 25/06/2021 - 19h05
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Profissionais de enfermagem de Mato Grosso do Sul protestam desde o começo de 2021 a favor do projeto de lei (PL) nº 2564 de 2020, que prevê piso salarial nacional e melhores condições de trabalho para a categoria. As manifestações incluem mobilização para divulgar a consulta pública do Senado Federal e a realização de passeata, que aconteceu em Campo Grande no dia 13 de maio. Os principais problemas relatados por trabalhadores do estado para o Conselho Regional de Enfermagem (Coren/MS) são a desvalorização, sobrecarga de trabalho e baixos salários, condições que foram agravadas com a pandemia de coronavírus. Mato Grosso do Sul possui 27.300 profissionais divididos entre enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares e parteiras.

O Projeto de Lei de autoria do Senador Fabiano Contarato (REDE/ES) está em tramitação no Senado Federal.  O projeto define piso salarial de R$ 7.315,00 para enfermeiros com base na carga horária de 30 horas semanais. Técnicos devem receber 70% deste valor e auxiliares e parteiras 50%. Em Mato Grosso do Sul, entidades como o Coren e o Sindicato dos Trabalhadores na área de Enfermagem  (SIEMS) apoiam a mudança. 

Presidente da Comissão para Instituição do Piso Salarial do Coren/MS, Flávio Tondati relata que os representantes da categoria no estado estiveram “presentes na reunião nacional com todos os conselhos regionais de enfermagem em maio deste ano, juntamente com o Cofen e demais autoridades, como senadores, deputados, entidades sindicais e de classes”. Segundo Tondati, foram realizadas mais de 500 fiscalizações em todo o estado em 2021 para averiguar denúncias de irregularidades trabalhistas. “Recebemos relatos de jornadas extensivas de trabalhos, baixos salários, falta de condições de repousos para os trabalhadores noturnos, dificuldade e insuficiência de equipamentos de proteção individual, entre outros”. 

Enfermeira do Hospital da Unimed de Campo Grande, Ariane Mendonça afirma que o Projeto de Lei é uma oportunidade para promover o debate público sobre a valorização da categoria. Segundo a enfermeira, os profissionais da área costumam realizar “atividades com uma grande pressão psicológica, com desgaste físico gigantesco decorrente das condições de serviço, mas mesmo assim muitas vezes não tem um trabalho digno”. Ariane Mendonça relata que é comum enfermeiros acumularem vínculos empregatícios para suprir as necessidades financeiras. “Já vi profissionais que têm três trabalhos, que trabalham de manhã, tarde e noite. Quase não param em casa para tentar agregar valor ao salário para conseguir sobreviver”.

A pandemia é considerada pelos profissionais como um fator de agravamento da precarização da enfermagem. Segundo Ariane Mendonça, trabalhar diariamente com casos de pacientes com covid-19 trouxe desgaste emocional. "Todos os dias vejo pessoas morrendo, vejo pacientes indo embora sem poder se despedir de seus familiares. Isso é uma das piores coisas, sentimos uma angústia muito grande. Sempre comentamos entre as equipes, como os profissionais vão ficar depois da pandemia? Cuidamos dos outros, mas quem cuida de nós?”. A enfermeira relata que a classe foi reconhecida pela população no começo da pandemia e que poucos continuaram a falar no assunto após alguns meses. “A pandemia trouxe coisas importantíssimas em questão de valorização, mas não podemos nos deixar perder. Não podemos deixar nosso trabalho ser em vão, cair no esquecimento. O projeto de lei é importante por conta disso, ele mostra que está difícil, mas existe uma forma da gente se valorizar”.

A enfermeira Giselle Freitas, que atua no Programa Saúde da Família do Sistema Único de Saúde (SUS) na cidade de Figueirão, afirma que a falta de insumos para realização do trabalho é recorrente e que as condições podem variar entre diferentes instituições. “Trabalhamos muito e em condições precárias. Muitas vezes enfrentamos falta de materiais, medicamentos, falta de um atendimento ao próprio profissional que muitas vezes precisa”. Para a enfermeira, a disparidade salarial entre enfermeiros e médicos é injustificável. “Precisamos ser um pouco mais valorizados financeiramente. Trabalhamos junto com os profissionais médicos, por exemplo, e os salários são muito desiguais. Isso não é certo porque na verdade um serviço necessita do outro para ter andamento”. Giselle Freitas afirma que as reivindicações trabalhistas feitas pela categoria são compatíveis com as dificuldades enfrentadas no exercício da profissão.

Primeira Notícia · Giselle Freitas, enfermeira, enfatiza a importância da valorização da categoria.

Enfermeira e servidora pública da Secretaria de Saúde de Campo Grande, Luana Borges acredita que as chances de aprovação do projeto de lei são reduzidas. “Infelizmente não tenho muita esperança de que ele vá para a frente. Vai contra todas as instituições privadas de laborização da enfermagem. Nós somos muitos e ninguém quer pagar o que a gente merece. Mas torcemos e estamos na luta, é algo que já passou da hora de acontecer”. Luana Borges relata que trabalha diariamente com pacientes com Covid-19, o que acarreta em impactos psicológicos. “A gente chega em casa e pensa “meu Deus, será que eu posso estar contaminando a minha família, as pessoas que moram comigo?''. Vem essa culpa de uma coisa que nem tem o que fazer, porque a gente tem que trabalhar. Mas expor os nossos, as pessoas que a gente ama, é muito difícil. Também é muito difícil ver colegas de profissão adoecendo, colegas falecendo”.

Luana Borges afirma que o debate sobre a falta de reconhecimento dos profissionais é algo que deveria estar em pauta há anos. “A gente ama o que faz, mas a enfermagem também é uma profissão, uma ciência. A gente precisa ser valorizado, precisa ser pago para desempenhar isso. Não podemos viver só de caridade, de amor ao próximo”. Para a enfermeira, a pandemia propicia a discussão sobre a valorização da categoria. "As pessoas estão começando a ver o tanto de coisa que a gente faz e quanto o nosso papel é fundamental na equipe multidisciplinar. Esse é o momento para abraçar a causa e tentar fazer isso acontecer”.

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