SAÚDE

Taxa de cesáreas no Estado é quatro vezes maior do que a recomendada

Índice do procedimento no Mato Grosso do Sul é de 61%, a Organização Mundial da Saúde recomenda que, no máximo, entre 10 e 15% dos partos sejam cesáreas

Isabella Procópio, Marina Gabriely, Raquel Alves19/11/2021 - 20h58
Compartilhe:

Mato Grosso do Sul registrou, entre janeiro e maio de 2021, 8.727 cesáreas em um total de 14.101 partos. O procedimento cirúrgico foi utilizado em aproximadamente 61% dos partos no período de cinco meses. Campo Grande registrou 7.295 partos, nos cinco primeiros meses do ano, e 59% deles foram cesarianas. 

Documento publicado na página da Organização Mundial da Saúde (OMS), informa que a comunidade médica internacional recomenda que 15% dos partos sejam feitos por meio do procedimento cirúrgico. Mato Grosso do Sul, em 2020, teve 62% dos partos realizados por meio da cesariana. De acordo com artigo publicado pela revista PLOS Medicine de pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz, cesáreas desnecessárias aumentam os riscos para a mulher e o bebê. Crianças que nascem de forma prematura, nas cesáreas eletivas, correm riscos maiores, como problemas respiratórios e disfunções no aparelho digestivo.

Estudo publicado na 38º edição da revista Femina, em agosto de 2010, cita os casos em que a cesárea é recomendada, como situações de desproporção da cabeça fetal e da pelve materna, duas ou mais cesáreas anteriores ou posição fetal não usual. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) divulgou a pesquisa Nascer no Brasil que constatou que quase 70% das mães desejavam parto vaginal no início da gestação e foram desencorajadas. A cesárea apresenta riscos como embolia pulmonar, hemorragia, infecção, trombose, aderência de alças intestinais e bexiga no útero e lesões na bexiga durante a cirurgia.

A psicóloga materna e fundadora da Papo de Gaia, Mariksa Ungerer explica que a realização da cesárea eletiva, sem a espera do momento em que a mulher entra em trabalho de parto, abre espaço para alguns riscos. “Os bebês que nascem de cirurgias eletivas, acabam passando por uma margem de perigosidade maior e por também virem ao mundo de uma forma talvez prematura, com dificuldade de respirar, com dificuldade de adaptação”. A psicóloga esclarece que a realização da cirurgia cesariana, em mulheres que entraram em trabalho de parto, garante chances maiores do bebê nascer com o sistema biológico mais forte.   

O Ministério da Saúde disponibilizou, na Biblioteca Virtual em Saúde, documento sobre a assistência humanizada à mulher que apontou os fatores que levam os médicos a optarem pela cesariana. O procedimento custa mais do que o parto vaginal e ocorre em tempo reduzido. Estudo realizado em 2019 pelos pesquisadores do Instituto Nacional da Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente, Aline Piovezan Entringer, Marcia Ferreira Teixeira Pinto e Maria Auxiliadora de Souza Mendes Gomes publicado na revista Ciência & Saúde Coletiva, demonstrou que o custo da cesárea eletiva é de em média R$ 1.113,70 e o custo de um parto vaginal é em média R$ 808,16. O documento do Ministério da Saúde apresenta que, como consequência dessa cultura pró-cesárea, parte dos obstetras estão incapacitados para acompanhar um parto normal.   

A doula e educadora perinatal Carla Camargo esclarece que sua função é informar a gestante e o companheiro sobre as opções para a realização do parto. “Eu como doula, preparo esse casal, auxílio eles na elaboração do plano de parto para que eles decidam, mostrando pra eles os prós e contras de algumas intervenções. Então um parto humanizado e um parto normal, pode ser com analgesia, desde que seja a escolha dessa mulher e que ela entenda os prós e contras e os benefícios de se ter uma analgesia ou não". A doula afirma que o parto via cesariana deve ser colocado em prática apenas como uma segunda alternativa, para evitar a geração de mais riscos do que o normal.  

Uma em cada quatro mulheres sofreu violência obstétrica, de acordo com a cartilha Violência Obstétrica, produzida e publicada pela Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, em seu site. O parto humanizado surge como forma de evitar esse tipo de violência. A Organização Mundial da Saúde (OMS), no artigo  Parto humanizado um direito a ser respeitado, define o parto humanizado como condutas que respeitam o procedimento natural e evitam ações desnecessárias para fornecer um parto e nascimento saudável. A doutora em Reprodução Animal Izabella Pazzoto Alves Sena optou pelo parto humanizado no nascimento de seu primeiro filho. 

A cartilha da Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul define que o parto humanizado ocorre quando a mulher não é submetida à violência, intervenções ocorrem somente quando necessárias e a mulher atua como protagonista. Esse tipo de parto independe da via e do local em que o nascimento é realizado. A cartilha também aponta algumas ações caracterizadas como violência obstétrica, como a episiotomia desnecessária, lavagem intestinal durante trabalho de parto e ocitocina sem necessidade. Natalia de Oliveira Alves é mais uma das mulheres que optaram pelo parto humanizado por receio de sofrer violência. 

Primeira Notícia · A empreendedora e mãe Natália de Oliveira Alves fala sobre por que escolheu o parto humanizado.

O direito a um parto saudável é previsto em lei. A  Lei Estadual 5217/2018  cita que a violência obstétrica ocorre em casos como tratar a gestante de forma agressiva, recriminar a mulher por qualquer comportamento ou por características físicas ou fazer a gestante acreditar que precisa de uma cesariana quando é desnecessária. O Artigo seis da Constituição Federal garante a proteção à maternidade e o Artigo 196 reforça o dever do Estado em reduzir os riscos de agravos à saúde.

Compartilhe:

Deixe seu Comentário

Leia Também