Campo Grande registrou 750 tentativas de suicídio no ano passado, das quais 57 resultaram em morte, segundo dados do Núcleo de Prevenção à Violência da Secretaria Municipal de Saúde. Esses índices diminuíram entre os anos 2005 e 2012, de acordo com o Mapa da Violência e voltaram a subir. Até outubro deste ano 598 novas tentativas foram registradas. Os números crescentes motivaram debates sobre prevenção entre profissionais da saúde pública e uma audiência pública na Câmara Municipal de Campo Grande, realizada no dia 18 deste mês.
A depressão é a doença que desencadeia a maioria dos atos suicidas, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). No caso do professor, não houve procura por atendimento profissional ou mesmo aconselhamento dos familiares antes que as primeiras tentativas ocorressem. Ele diz que "foi tudo escondido". As conversas e as consultas com psicólogos e psiquiatras vieram depois, junto ao diagnóstico de depressão.
A OMS estima que 90% dos casos podem ser evitados quando há oferta de ajuda. Mato Grosso do Sul, o terceiro estado que mais registrou suicídios em 2012, com taxa de 8,4 mortes a cada 100 mil habitantes, também segundo o Mapa da Violência, dispõe de 22 de Centros de Atenção Psicossocial (Caps), que oferecem tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) com psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros e terapeutas ocupacionais, sem necessidade de encaminhamento de Unidade Básica de Saúde. Os Caps foram implantadas no estado como novo modelo de atenção psicossocial no país, instituída pelo Ministério da Saúde.
Melhorias no atendimento e prevenção mais eficiente
Na Capital há seis Caps e somente dois oferecem atendimento 24 horas atualmente. O número está abaixo do ideal definido pelo Ministério da Saúde, que é o de uma unidade para cada 100 mil habitantes.
A assessoria de imprensa da prefeitura informou que o atendimento das unidades existentes será ampliado até o próximo ano. Recursos do Ministério da Saúde garantirão funcionamento 24 horas de mais centros e também a transferência da sede do Caps do bairro Vila Planalto para um prédio na rua Bahia, no Centro.
Para o capitão do Corpo de Bombeiros e capelão do Hospital Universitário da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Edilson Reis as filas de espera por atendimento na saúde pública poderiam diminuir se houvesse mais unidades em Campo Grande. “Os profissionais são capacitados, orientados adequadamente, mas são poucas pessoas para atender uma demanda muito grande". Reis também é coordenador do Projeto Labirinto, que desde 2012 atua na capacitação profissional e em ações sociais para prevenir o suicídio. Ele é um dos ministrantes do primeiro curso realizado no país para formar profissionais da saúde pública, que começou em outubro e terminou neste mês.
A coordenação de saúde mental da Secretaria Municipal de Saúde de Campo Grande informou que não possui levantamento atual do número de atendimentos realizados e tampouco sobre o número de profissionais que trabalham em cada Caps.
Falar é forma de prevenir
O coordenador das atividades do Projeto Labirinto, professor Emerson Leite, explica que os principais alvos dos trabalhos são jovens e adultos. Palestras, premiações em escolas e intervenções urbanas são algumas das ações realizadas para combater os tabus, mitos e preconceitos.
Sancionada em setembro deste ano, a Lei Municipal 7.982 institui medidas de prevenção nas escolas da Rede Pública de Ensino de Campo Grande por meio de palestras, dinâmicas de grupo, incentivo à leitura de obras literárias, oficinas e filmes educativos.
O Grupo Amor e Vida (GAV), antiga unidade do Centro de Valorização à Vida (CVV) em Campo Grande, é uma ONG que doa befriending (em português, tratamento de amizade) por meio de ligação telefônica ou atendimento presencial. O GAV tem 14 anos de existência e recebeu mais de 100 mil ligações de várias partes do país pelo número de telefone 141. Atualmente possui 35 voluntários, número insuficiente para realizar atender toda a demanda.
Para o coordenador da ONG, Roberto Sinai, escutar com atenção é a forma mais eficiente de ajudar. “Não aconselhamos e não julgamos, apenas ouvimos. Muitas vezes a pessoa emite alertas, gritos de socorro e está solitária, mas não é ouvida. A dor compartilhada dói menos”. O GAV pode salvar vidas, mas depende de doações e mobilizações para arrecadar dinheiro para a manutenção da sede e das linhas telefônicas.
O Projeto Labirinto e o GAV não possuem vínculos e fins políticos, econômicos ou religiosos. Para ser um voluntário ou colaborador da ONG é preciso entrar em contato pelos números 141 ou (67) 3383-4112. É oferecido um curso gratuito com duração de quatro meses aos interessados no voluntariado.
Amizade, apoio familiar e profissional
A psicóloga clínica Fabíola Rottili explica que é possível identificar sinais que podem levar ao suicídio. Dificuldades para resolver questões pessoais e isolamento social, por exemplo, podem anteceder o aparecimento das ideações, que são pensamentos suicidas, quando é necessária a intervenção imediata. “Não podemos demorar”.
Para Rottili, “é importantíssima e fundamental a rede de apoio social e familiar, além de um acompanhamento regular e multiprofissional” em todos os momentos, inclusive durante a reabilitação.