A representatividade da mulher nas empresas de comunicação sul-mato-grossenses não reflete a realidade dos 25 anos do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, UFMS. Dos 774 acadêmicos que se formaram neste período, 66% são mulheres. De acordo com pesquisa apresentada durante a Semana de Jornalismo da UFMS, Semajor, em seis dos principais veículos de comunicação de Campo Grande apenas a TV Record tem uma equipe de jornalistas majoritariamente feminina. Entre seus 21 profissionais de imprensa, 18 são mulheres.
O painel na Semajor discutiu o tema “A representação e a representatividade da mulher na mídia – O que mudou nos últimos 25 anos?” no dia 24 de outubro, com a participação da editora do caderno de cultura do jornal O Estado de Mato Grosso do Sul, Daiane Libero, e da jornalista do SBT, Carmen Cestari.
Carmen Cestari explica como vê a representação da mulher na mídia. “Eu acho que na mídia em geral a mulher ainda é explorada de uma maneira tendendo muito escancaradamente para a sensualidade, para o erotismo, como objeto ainda, mas tem outro lado, que nós somos a notícia, nós somos protagonistas de muitos processos. Então a gente está na mídia o tempo todo, o que a gente tem que discutir dentro da universidade é justamente isto, de que maneira nós, enquanto profissionais do jornalismo atuamos na mídia e de que maneira nós tratamos a mulher que é colocada na mídia por nós.”
Para a doutora em sociologia Ana Gomes, a mídia é um poderoso veículo de produção e reprodução de valores preconceituosos e excludentes. “Homens e mulheres ao assistirem os programas, lerem revistas, tem ainda mais enraizados esses valores, ao invés de serem questionados e transformados”.
Ana Gomes reforça o que diz Cestari em relação a forma como a mulher é vista na sociedade e, em consequência, no seu ambiente de trabalho. “A representação da mulher continua a ser baseada em valores tradicionais e excludentes. Nas propagandas vemos dois tipos de representação: seu corpo é usado como objeto sexual, de biquíni com roupas insinuantes e com o padrão de beleza considerado como válido para a sociedade. A segunda forma é igualmente prejudicial à mulher, de representá-la em seu papel tradicional dado pela sociedade, ou seja, vinculada ao espaço doméstico, servindo refeições, lavando roupa, associada a produtos de limpeza, cuidado dos filhos, etc. As revistas, novelas e programas repetem esses estereótipos, centrando em regimes, exercícios, como cuidar da pele, etc, incentivando-as a buscar um corpo esbelto, alto, louro. Ou então dando “receitas” de como conquistar ou manter seu homem”.
A editora Daiane Libero falou sobre a a contribuição do movimento feminista no texto jornalístico. “Eu conheço meus direitos e luto por eles. Primeiro que isso me ajuda muito a tentar ser mais isenta possível no que eu faço. Não dá para você não acreditar em uma coisa e não trabalhar com ela no seu dia a dia. Eu não caio em discurso machista, então eu trabalho isso no que eu faço”.
Carmen Cestari acredita que ocupar cargos de chefia é mais difícil para as mulheres, “pela própria cultura machista que a gente ainda respira. O posicionamento de muitas mulheres ainda é ter essa cultura machista, muito intrínseca e arreigada no nosso comportamento, ainda é mais difícil sim. E hoje as mulheres são sim profissionais que estão buscando cada vez mais respeito, na própria imprensa a gente tem ainda uma quantidade de mulheres que não é respeitada, a gente precisa cada vez mais desse empoderamento”.
Ana Gomes afirma que “o número de mulheres que tem que enfrentar a dupla ou tripla jornada de trabalho é cada vez maior. Essa cultura coloca a mulher em uma situação que a exclui do espaço público, de subalternidade, e em uma situação que a coloca como objeto sexual ou como a responsável única pelo espaço doméstico”.
Cestari fala sobre a importância de discutir assuntos relacionados à mulher no curso de Jornalismo. “Principalmente essas questões relacionadas à gênero são fundamentais porque primeiro, a gente tem um número bastante importante de mulheres em todas as etapas do fazer jornalístico, e a nossa evolução como profissional tem se dado muito lentamente. Então, essas discussões na universidade são fundamentais para o mercado de trabalho, para os alunos entenderem como que é o cotidiano de nós mulheres jornalistas e pra gente poder alcançar uma situação mais justa neste mercado de trabalho, em termos de salário, posicionamento e hierarquia.”
Daiane Libero considera que o jornalismo deve ser humanizado. “Enquanto a gente não for um ser humano melhor, como vamos ser jornalistas melhores? Se todos os nossos preconceitos e tudo que a gente acredita vai estar impresso no que a gente escreve ou no que a gente produz. O jornalista ideal vai além da pauta. O jornalista ideal não é aquele que toma partido, é aquele que se sensibiliza”.